É com uma saudação de profunda emoção, "Benção, mãe. Benção, pai.", que Ana Maria Gonçalves deu início ao seu discurso de posse na cadeira 33 da Academia Brasileira de Letras, no Rio de Janeiro, nesta sexta-feira (7). Celebrando suas raízes e ancestrais, ela foi recebida com aplausos calorosos. Ana Maria, reconhecida autora do romance histórico *Um defeito de cor*, se destaca como a 13ª mulher a integrar a instituição, fundada em 1897. Ela entra para a história como a primeira mulher negra eleita, com um discurso impactante, celebrando sua chegada e homenageando aqueles que pavimentaram seu caminho. No discurso, Ana Maria recordou os notáveis precedentes da cadeira 33, como Domício da Gama, jornalista fundador, e Evanildo Bechara, proeminente linguista, destacando suas contribuições. "Em 1954 a 1985, Bechara publicou mais de vinte livros. Ele foi crucial na criação do novo acordo ortográfico", destacou a nova acadêmica. Negando a tradição excludente, Ana Maria abordou a história da resistência feminina na academia, citando a candidatura rejeitada de Amélia Beviláqua em 1930. “Foi um acordo entre cavalheiros que impede mulheres”, afirmou Ana Maria. A lista de mulheres que superaram essas barreiras inclui Rachel de Queiroz, Lygia Fagundes Telles e outras, que Ana Maria celebrou em seu discurso. Falando sobre o passado de exclusão, ela disse: “Ainda somos poucas para tanto trabalho na reconstrução do imaginário”. Outro ponto de reflexão foi a representação negra na Academia. Ana Maria mencionou a importância dos debates em torno das candidaturas de Conceição Evaristo e Ailton Krenak: "Contribuíram para que eu estivesse aqui hoje". Assumindo sua posição, Ana Maria prometeu promover a diversidade e abrir as portas da ABL: "Cá estou eu, 128 anos depois, como a primeira escritora negra. Quero promover a diversidade e ampliar a divulgação da literatura brasileira". Finalizando, citou influências de figuras literárias negras e reforçou a importância de recuperar identidades a partir da literatura. Lilia Schwarcz apresentou Ana Maria, destacando as vozes que ela trouxe à literatura e, agora, à Academia. Ana Maria Machado e Gilberto Gil participaram da cerimônia, liderando respectivamente a entrega do colar e diploma. A importância deste momento foi testificada por Miriam Leitão, que ressaltou a entrada de Ana Maria como histórica e significativa para a representatividade na Academia. Conceição Evaristo descreveu a posse como uma vitória coletiva e Gilberto Gil enfatizou o papel relevante de Ana Maria para a literatura e a cultura negra no processo civilizatório brasileiro. Após a cerimônia, um jantar para 300 convidados ocorreu, com um cardápio elaborado pela chef Dilma do Nascimento, inspirado em *Um defeito de cor*. "É um marco de reconhecimento da nossa herança africana".